Presidente da Câmara no Período Monárquico
No que se refere às Legislaturas do Período Monárquico, uma situação importante a se mencionar é a definição de quem seria o presidente da casa e quais seriam as responsabilidades de seu cargo. Torna-se importante salientar tal assunto em Joinville, já que a historiografia local acabou cometendo e perpetuando dois enganos.[nota 1]
Até 1881, o Presidente da Câmara não era eleito pelos pares
Eleito pelo povo
Não é coincidência que até 1880, por quatro legislaturas, o presidente tivesse sido sempre o vereador mais votado pelo povo. Diferente do que algumas publicações clássicas da historiografia joinvilense informam, a legislação vigente não previa que os vereadores escolhessem seu presidente.
Apolinário Ternes e Herculano Vicenzi, na obra "Legislativo de Joinville - Subsídios para sua História", afirmam que
"Conforme a organização judiciária e admnistrativa, os eleitos deveriam eleger o presidente da Câmara (...)[1]
Elly Herkenhoff, na obra entitulada "Nossos Prefeitos", alega que:
Empossada a primeira Câmara Municipal, em sessão solene a 13 de janeiro de 1869, foi eleito Presidente pelos Vereadores reunidos, o cidadão João Adolfo Haltenhoff e Vice-Presidente o cidadão Frederico Lange (...)[2]
Carlos Ficker (1965, p. 262), em História de Joinville - Crônicas da Colônia Dona Francisca, informa:
Empossada em sessão extraordinária, aos 13 de janeiro de 1869, constituíu-se a primeira Câmara Municipal de Joinville, sendo eleito Presidente o Sr. Adolph Haltenhoff; secretário, o Sr. Ulrich Ulrichsen; e substituto, o Sr. Friedrich Lange.
De certa forma, a população elegeu Haltenhoff como presidente ao dar-lhe mais votos, por isso, pode-se dizer que ele foi eleito presidente. Porém, parece que Ficker tenha tentado dizer que na sessão de 13 de janeiro é que Haltenhoff teria sido eleito presidente da câmara.[3] O que se depreende da leitura do artigo 168 da Constituição Federal então vigente (de 1824), cuja imagem encontra-se ao lado, é que o vereador com mais votos automaticamente assumia a presidência, sem necessidade de eleição interna para isso. De fato, a Ata da primeira Sessão Ordinária da Primeira Legislatura, até hoje em guarda do Arquivo Histórico de Joinville, silencia sobre qualquer escolha de seu presidente, e Haltenhoff já inicia a primeira sessão na condição de presidente da Câmara.
Eleito pelos pares
A Lei Saraiva, de 1881, efetuou uma mudança na maneira como se definia o presidente das Câmaras de Vereadores. A partir dessa lei, estes e seus vices deveriam ser eleitos anualmente pela própria Casa. Os secretários continuariam a ser empregados da Câmara e não um dos vereadores.
No dia 7 de janeiro de 1883, João Paulo Schmalz foi o primeiro presidente da Câmara a ser eleito dessa forma, sendo Antônio José Ribeiro escolhido como Vice-Presidente da 5ª Legislatura Monárquica.[4] Foi a primeira vez que o mais votado não assumia a cadeira da presidência.
O Presidente da Câmara não era chefe do executivo
Sobre as atribuições do cargo dos primeiros presidentes, recaía aquelas inerentes ao cargo, de convocar reuniões extraordinárias quando preciso, ou de manter a ordem durante as sessões, por exemplo.
Falando sobre o tema, porém, o já citado livro de Ternes e Vicenzi informa que:
(...) o presidente da Câmara, (...) por sua vez exerceria as funções de superintendente municipal, o cargo atual de prefeito."
Elly Herkenhhof, na obra também já citada, diz que:
Segundo as leis da época, eram conferidos aos Presidentes das Câmaras Municipais funções executivas, as mesmas funções mais tarde outorgadas aos Superintendentes, hoje chamados Prefeitos.
A Constituição de 1824 é muito econômica quando fala das atribuições da Câmara, ficando seu detalhamento a cargo da posterior lei de 1º de Outubro de 1828. Tal lei nada fala que poderia dar a entender que o presidente receberia a designação de superintendente municipal, ou pelo menos, autoridade para atuar como chefe do executivo. As decisões legislativas e executivas eram colegiadas, tomadas pela Câmara, não unilateralmente pelo seu presidente.
As decisões da Câmara registradas em atas demonstram essa situação. Por exemplo, a Ata da sessão de 11 de outubro de 1869 autorizava a Comissão de Obas Públicas a aplicar dois contos de réis para reparos nas estradas. Isso mostra que a execução não era realizada pelo presidente, mas ele apenas costumeiramente dava seu visto nas contas. Outro exemplo é a Ata da sessão de 27 de janeiro de 1870, que menciona um projeto da Comissão de Obras Públicas para fazer a manutenção da Blumenaustrasse, nas margens do rio Águas Vermelhas (Estrada Blumenau, atualmente XV de Novembro naquele ponto). A Câmara pediu que tal comissão fizesse um orçamento.
Além disso, na Ata da Sessão de 28 de maio de 1870,[5] registrou-se que a Câmara encarregou o vereador Bernard Poschaan Jr. de aterrar onde fosse preciso o atual final da rua XV de Novembro, onde hoje é o bairro Vila Nova. A ordem de executar o serviço partiu da Câmara, e não de seu presidente. A execução ficou a cargo de um vereador, e não ao presidente da casa. Fica claro que o presidente não saía atuando como um prefeito atuaria mais tarde, mas as decisões eram tomadas em colegiado pela Câmara. Então, a Câmara toda era a prefeitura, não seu presidente isoladamente.
A comissão de Obras Públicas não raro cuidava de fazer os reparos necessários, até que a Câmara decidiu dividir Joinville em distritos e nomear zeladores para cuidar de estradas. Isso novamente mostra que o presidente da Câmara não tomava decisões à maneira de um chefe do executivo, mas os zeladores executariam a manutenção, estando sob às ordens da Câmara (e não do seu presidente).[6]
Pesquisador: Patrik Roger Pinheiro - Historiador | Registro Profissional 181/SC
Como Citar |
Referência
PINHEIRO, Patrik Roger. Presidente da Câmara no Período Monárquico. Memória CVJ, 2023. Disponível em: <https://memoria.camara.joinville.br/index.php?title=Presidente_da_C%C3%A2mara_no_Per%C3%ADodo_Mon%C3%A1rquico>. Acesso em: 14 de dezembro de 2024. |
Citação com autor incluído no texto
Pinheiro (2023) |
Citação com autor não incluído no texto
(PINHEIRO, 2023) |
Notas
- ↑ Tais enganos se perpetuaram em outras obras, como o livro "Joinville, a Construção da Cidade" (Apolinário Ternes), "Da Comuna aos Tempos Atuais: A História do Legislativo de Joinville" (Coordenado por Róger Bitencourt, e produzido a pedido da Câmara de Joinville), Artigos publicados em edições da Revista "Blumenau em Cadernos" e na lista de Prefeitos de Vereadores, conforme aparece na Wikipédia (2023). A lista não é exaustiva.
Referências
- ↑ Ternes, A; Vicenzi, H. Legislativo de Joinville - Subsídios para sua história. 2 Ed. Joinville: Editora Letra D'Água, 2006. ISBN: 85-87648-09-8
- ↑ Herkenhoff, Elly. Nossos Prefeitos - 1869-1903. Joinville: Prefeitura de Joinville, 1984.
- ↑ Ficker, Carlos. História de Joinville - Crônicas da Colônia Dona Francisca. 2 Ed. Joinville: Impressora Ipiranga, 1965. ISBN: 8578020197
- ↑ Noticias Locaes. Gaeta de Joinville, 10 de janeiro de 1883. Visitado em 12/04/2023
- ↑ Ata da Sessão de 28 de maio de 1870, em guarda do Arquivo Histórico de Joinville.
- ↑ Ata da Sessão Ordinária de 21 de agosto de 1873, em guarda do Arquivo Histórico de Joinville.