Lei de Desafetação
Em 1989 e anos adjacentes, durante a 11ª Legislatura, Joinville vivia intensa imigração e problemas com invasão de propriedades públicas e até mesmo privadas, incluindo terras de marinha, como manguezais. O grande fluxo migratório trouxe dificuldades para administração municipal, uma situação que a prefeitura sob a administração de Luiz Gomes (Lula) buscou enfrentar.
Entre os projetos de Lula para amenizar a dificuldade, estava a construção das "chalulas" casas construídas para pessoas de baixa renda, através do projeto municipal de habitação. No início de 1990, entrou na câmara o projeto de desafetação, que buscava transferir para famílias carentes algumas propriedades municipais imóveis, já invadidas. Esse, porém, foi um projeto polêmico, que dividiu opiniões na CVJ.
Pontos a Favor
Se fosse aprovado o projeto de desafetação, pelo menos mil e oitocentas famílias de baixa renda seriam beneficiadas. Como era um número altamente expressivo, durante a discussão na Câmara, moradores dessas regiões invadidas foram à CVJ entregar cartas, bilhetes e fazer um copo a corpo buscando sensibilizar os vereadores à causa deles.
O projeto contou com forte lobby do prefeito Lula e do secretário de Desenvolvimento Comunitário, Adelor Vieira. Adelor, autor do projeto, entendia que os lotes não deveriam ser doados, mas vendidos a valores acessíveis. A lei deveria conter dispositivo proibindo outras regulamentações a novas invasões.[1] Para o executivo municipal, seria menos dramático assentar essas famílias no local que já estavam do que expulsá-las e pedir reintegração de posse, evitando possíveis desgastes políticos.[2] Não havia só recém-chegados nas áreas invadidas. Alguns desses imigrantes já estavam em Joinville a quase uma década, criando raízes, e trabalhavam há anos na indústria local. Seus filhos já estudavam há anos na mesma escola.[3]
Pontos Contra
Mas muitos vereadores temiam o precedente. Todo loteamento precisa ter espaços reservados para o poder público construir posteriormente instalações comunitárias, como creches, escolas, postos de saúde, etc. Bem, eram justamente essas terras que foram invadidas e estavam agora prestes a ser entregues aos invasores. Outro problema residia nas novas ondas de invasões. Teriam também os novos imigrantes o direito de invadir imóveis públicos e esperar pela regularização?[2] Alguns vereadores achavam que não deviam incentivar isso.
Tramitação Conturbada
O projeto de lei não teve vida fácil na CVJ. Cada vez que seria apreciado pelo plenário, aparecia um pedido de vistas.[1] Então, o projeto simplesmente desapareceu. Depois que Sérgio Silva pediu vistas, o projeto deixou de poder ser localizado. Sérgio não sabia onde ele tinha ido parar. Norival Silva tachou Sérgio Silva de irresponsável. Sem o projeto presente na sessão ordinária, o vice Sdrigotti sugeriu ao presidente Pessoa Machado que adiasse a votação, o que o presidente acatou.
Como se pode imaginar, os posseiros presentes no plenário não deviam ter ficado felizes com o sumiço do projeto e o adiamento da votação. Então, diante da pressão dos presentes, o presidente Pessoa Machado disse que não só votaria a favor do projeto, mas que também proporia emenda para doação, e não venda dos lotes. Logo Machado, que era contrário à proposta.
Waldomiro Dordet classificou a mudança de posicionamento do presidente da casa como uma jogada demagógica. Dordet disse que Pessoa Machado deu um "mel na chupeta", para acalmar os posseiros manifestantes e evitar tumultos.[4]
A Votação
No dia 31 de janeiro, a Câmara se reuniu para realizar a sessão que votaria o projeto de desafetação, sessão esta que se prolongaria até um pouco antes de uma hora da madrugada. O plenário contou com a presença de cem moradores, que só arredaram o pé dali após ver o projeto ser aprovado. A proposta de emenda de Pessoa Machado, pretendendo doar os lotes em vez de vendê-los, não conseguiu aprovação. Outra emenda, porém, foi aprovada: os fundos arrecadados com esses lotes seriam depositados em um fundo destinado à construção de equipamentos públicos nessas regiões.
A Sessão foi tumultuada, e Norival Silva, contrário ao projeto, pediu que os moradores ali presentes não votassem nele caso ele fosse candidato, porque ele não concordava com aquilo: "Não votem em mim, e muito menos neles", disse ele, se referindo aos que apoiavam o projeto de lei. Para Norival, os vereadores estavam mais preocupados em ações eleitoreiras do que de estado.[5][6]
O jornalista Antonio Neves descreveu a sessão como um embate de alto nível entre o líder oposicionista do PMDB, Sérgio Silva, e o líder do governo, Nestor Westrupp. Sérgio Silva, por exemplo, apresentava consecutiva emendas ao projeto, obrigando a novas rediscussões, retardando a votação. Westrupp, usando de conhecimento parlamentar e jurídico, frustrava algumas ações de Sérgio.[7]
O projeto foi aprovado, se tornando a lei 2378/1990,[6] mesmo com os votos contrários de Silvio Fortunato, Teresa Campregher Moreira, Décio Krelling, Altair Pereira, Renato Liebl e Sérgio Silva.[8]
Pesquisador: Patrik Roger Pinheiro - Historiador | Registro Profissional 181/SC
Como Citar |
Referência
PINHEIRO, Patrik Roger. Lei de Desafetação. Memória CVJ, 2024. Disponível em: <https://memoria.camara.joinville.br/index.php?title=Lei_de_Desafeta%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 1 de abril de 2025. |
Citação com autor incluído no texto
Pinheiro (2024) |
Citação com autor não incluído no texto
(PINHEIRO, 2024) |
Referências
- ↑ Ir para: 1,0 1,1 Desinfetação. A Notícia, 23 de janeiro de 1990.
- ↑ Ir para: 2,0 2,1 Antonio Neves. Coluna Alça de Mira. Desafetação. A Notícia, 23 de janeiro de 1990.
- ↑ Antonio Neves. Coluna Alça de Mira. Projeto Polêmico. A Notícia, 23 de janeiro de 1990.
- ↑ Desafetação. A Notícia, 28 de janeiro de 1990.
- ↑ Antonio Neves. Coluna Alça de Mira. Projeto Polêmico. A Notícia, 21 de janeiro de 1990.
- ↑ Ir para: 6,0 6,1 Câmara aprova Projeto em Sessão Tumultuada. A Notícia, 02 de fevereiro de 1990.
- ↑ Antonio Neves. Coluna Alça de Mira. Rescaldo da Sessão (2). A Notícia, 02 de fevereiro de 1990.
- ↑ Antonio Neves. Coluna Alça de Mira. Esclarecem. A Notícia, 14 de fevereiro de 1990.